Investindo na cultura da Segurança

Investindo na cultura da Segurança

Todos os anos, na UE, são inúmeros os casos de acidente e lesões ocorridos no local de trabalho que entram para as estatísticas oficiais. Portugal, não sendo uma exceção, apresenta nos últimos 3 anos uma redução do número de Acidentes mortais de Trabalho (dados do ACT ). Dos 140 casos registados em 2015, cifraram-se em 119 no ano de 2017, o que corresponde a um decréscimo de 15%. Estes dados revelam ainda que a tipologia mais grave de acidente de trabalho, apresenta maior incidência nos trabalhadores com contrato de trabalho sem termo e a desempenhar atividades em pequenas e micro empresas. Por outro lado, note-se também que o custo dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais na UE-15 oscila entre os 2,6% e os 3,8% do Produto Interno Bruto, o que revela o seu peso para a economia de cada país.

Apesar destes dados, é certamente reconhecido que as preocupações no âmbito da Segurança e Saúde no Trabalho (SST), têm vindo a assumir nos últimos anos um papel cada vez mais marcante na gestão das empresas. Na verdade, este não é um tema recente; data já de 1895 a primeira lei especifica sobre higiene e segurança no trabalho aplicada ao sector da construção e obras públicas; de 1936 o regime jurídico de reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais e de 1973 a publicação da Lista de doenças profissionais (entre muitos outros diplomas). Este caminho evolutivo que conduziu à introdução e adoção de boas práticas em matéria de Segurança e Saúde no Trabalho, encontra-se, entre outros, mais recentemente consagrado na legislação atual, nomeadamente no Código do Trabalho (artigo 281º) que estabelece os “Princípios gerais em matérias de Segurança e Saúde no Trabalho” e na Lei 102/2009 de 10/09 (alterada pela Lei 3/2014 de 28/01).

Sendo o foco atual a prevenção, são vários os mecanismos que a Organização dispõe para dar consecução a este objetivo e imperativo legal. O envolvimento dos Trabalhadores, recorrendo inclusivamente à “Consulta dos Trabalhadores” previsto no Artigo 18.º da Lei nº 3/2014 e que realizada periodicamente possibilita a sua auscultação em matérias de Segurança e Saúde no Trabalho, assim como a implementação de medidas sistemáticas de Avaliação dos Riscos previsíveis por posto de trabalho (artigo 15º da mesma Lei), são disso bons exemplos e que quando colocados adequadamente em prática possibilitam à Organização ganhos consideráveis nesta matéria.

Como Construir uma Cultura de Segurança?

Sendo a construção da Cultura de Segurança de uma Organização efetuada diariamente, é na verdade o resultado dos comportamentos, atitudes, ações, valores, envolvimento e tomadas de ação de todos, contribuindo direta ou indiretamente para a segurança no local de trabalho e da própria Organização no seu todo.

Contudo a implementação prática de processos e hábitos seguros dentro da rotina da Organização, pode, independentemente da sua dimensão, constituir-se num forte desafio. O modelo a adotar dependerá sempre de cada estrutura/Organização e das suas próprias característica (dimensão, nível de participação dos trabalhadores, formação, etc.).

Com vista ao desenvolvimento de uma culta de segurança eficaz e que atue na prevenção de riscos, podem considerar-se genericamente as seguintes Sete Etapas:

⦁ Envolvimento da Gestão de Topo – O envolvimento/compromisso da gestão, desdobrado nos diversos níveis hierárquicos é crucial para a obtenção de resultados sustentáveis na prevenção de acidentes e implementação de uma Cultura de Segurança. A Gestão, deverá manifestar ativamente o seu compromisso não apenas com a disponibilização dos meios e recursos materiais necessários, como também com a sua presença em ações que envolvam os colaboradores, nomeadamente em reuniões de trabalho sobre o tema, ações de formação, treinos, visita aos locais de trabalho e incentivando a participação de todos. A Gestão de Topo da Organização deve desenvolver uma liderança manifestada pelo exemplo e pela presença.

Analisar, Investigar e Documentar – Esta etapa sendo fundamental anda também a par com a anterior, pois sem uma profunda análise da Organização sobre a ótica da SST, dificilmente se conseguirá estruturar plenamente as ações seguintes. Recorrendo à realização da Análise dos Riscos previsíveis nos locais de trabalho, investigação das causas de acidentes e incidentes ocorridos, índices de sinistralidade da Organização (entre outras ferramentas), a Organização poderá detalhar e determinar o que pode melhorar em matéria de Segurança e Saúde no Trabalho. Esta etapa deve levar ao conhecimento do estado atual da Organização e simultaneamente permitir estabelecer/calendarizar atividades e responsáveis pela implementação de ações com vista ao atingimento dos objetivos determinados como necessários.

⦁ Envolvimento, Participação e Comunicação – Apenas com colaboradores envolvidos na consecução de um objetivo comum e que tenham assumido o seu papel e responsabilidade para a implementação de uma Cultura de Segurança, o objetivo poderá ser atingido. Se é critico que os funcionários se envolvam diariamente no sistema de prevenção de acidentes e no desenvolvimento da Cultura de Segurança da Organização, participando e contribuindo com as suas boas práticas, dando a sua opinião e sugestões, também não será menos importante que a comunicação esteja permanentemente facilitada entre todos os níveis da Organização. A adoção de sistemas formais e informais de sugestões/participação, pode contribuir para uma comunicação mais dinâmica e fluída entre todos.

⦁ Formação e treino – A Formação assume diversas funções em todo este processo. Se por um lado o papel da formação se centra na preparação e consciencialização dos colaboradores para os riscos e perigos a que se encontram expostos nas suas operações/atividades, não será também negável o contributo da formação para demonstrar o compromisso da empresa para com a Segurança. Na realidade, Trabalhadores formados e treinados integram-se com maior facilidade na Cultura de Segurança da Organização e desenvolvem muitas vezes o autocontrolo, assumindo cada um o papel de “fiscal de si próprio”, com o objetivo de garantir a sua segurança e da respetiva equipa.

⦁ Análise e tratamento de ocorrências – Todas as ocorrências devem ser registadas, analisadas e investigadas. A participação dos Trabalhadores na investigação de acidentes ou em equipes de auditoria interna constitui também uma ferramenta fundamental não só para o seu envolvimento, como também para a identificação das soluções mais adequadas, uma vez que são os colaboradores quem melhor conhece de perto cada realidade.

Monitorização – A monitorização regular dos objetivos estabelecidos e a adoção de medidas retificativas sempre que oportuno, asseguram a consistência da Cultura de Segurança da Organização e o direcionamento pretendido. A partilha de informação sobre o estado da Organização face aos objetivos traçados e a forma de os atingir deve ser regularmente comunicada.

⦁ Elogiar e comunicar comportamentos exemplares – Valorizar comportamentos exemplares de colaboradores e com resultados positivos para a SST constitui uma importante fonte de motivação e envolvimento de todos, a qual deve ser estimulada permanentemente pela Organização.
Benefícios de uma Cultura de Segurança

A implementação de uma verdadeira Cultura de Segurança impulsiona a Organização para um novo patamar, sendo várias as vantagens que dela decorrem direta ou indiretamente.

Genericamente podem-se apontar as seguintes consequências da adoção de uma Cultura de Segurança:

− Redução da taxa de absentismo por acidentes de trabalho e doenças profissionais, assim como dos respetivos custos de contratação e formação de novos colaboradores;
− Melhoria dos níveis de produtividade da Organização, decorrente da maior confiança dos trabalhadores na execução das tarefas. Métodos de trabalho mais eficazes e seguros permitem igualmente que o trabalho seja executado mais rapidamente;
− Diminuição do tempo de paragem provocado por acidentes de trabalho com a consequente redução dos custos da empresa com quebras de produção;
− Redução no prémio dos Seguros pago pela Organização. Empresas com bom desempenho em matéria de Segurança e Saúde no Trabalho realizam poupanças consideráveis, verificando-se o oposto para as empresas que apresentam maior sinistralidade, as quais são penalizadas com prémios de seguro mais elevados;
− Maior retenção de colaboradores, mão-de-obra mais competente e mais saudável;
− Possível rentabilidade de 12:1 (um benefício de 12 euros por cada euro investido) em SST 3.

Além destes fatores, só por si catalisadores de uma mudança Organizacional que privilegie a Cultura de Segurança, há ainda que ter em conta que a Segurança e a Saúde no Trabalho contribui também para demonstrar interna e externamente que a Organização é socialmente responsável. Protegendo e reforçando a sua imagem, o valor da própria marca no mercado e indo ao encontro das expectativas dos Clientes, cada vez mais sensíveis para esta matéria.

Comportamento Social / Valor da Organização

A figura anterior representa a relação estabelecida por Leipziger no que concerne à perceção do Valor Global da Organização pelos Clientes, tendo em consideração os comportamentos sociais desta. Espelhando também nesta perspetiva o impacto para a Organização, de uma Cultura de Segurança.

Conclusão:

Na verdade, qualquer Organização colherá benefícios do investimento que promover em matéria de SST e no desenvolvimento de uma Cultura de Segurança, os quais que se traduzirão também no aumento da sua competitividade e rentabilidade.

Em contrapartida tenha-se presente que um mau desempenho em matéria de SST pode ter um impacto significativo nas empresas, em particular nas de menor dimensão. Os custos decorrentes de paragens prolongadas, da perda de vidas humanas e consequentes processos judiciais, ditam muitas vezes o seu encerramento. Dados globais, apontam que 60% das empresas que param a sua laboração por mais de nove dias em consequência de acidentes, acabam por fechar4!

Decorrente também de uma sociedade cada vez mais sensibilizada para esta matéria, as empresas têm toda a vantagem em implementar um bom sistema de SST e acompanhar o seu desempenho global. Para além dos benefícios diretos já enunciados, os benefícios associados à sua reputação, compromisso com a responsabilidade social, assim como a manutenção e reforço da confiança de clientes, investidores e demais partes interessadas apenas pode constituir um reforço positivo da imagem da Organização.

 

José Guilherme Tavares | Responsável de Segurança e Saúde no Trabalho | Grupo ETE
Fonte: https://logisticamoderna.com