Indicam as pesquisas que o Brasil, há mais de 15 anos e apesar de ter um Produto Interno Bruto (PIB) que representa 2,4% do PIB mundial, tem apenas 1,2% das exportações. Enquanto isso o México, com PIB 35% menor que o brasileiro, exporta 100% mais; a Bélgica, com PIB 75% menor, exporta 110% mais; a Tailândia, com PIB 80% menor, exporta 10% mais. Consequentemente o país, entre as primeiras dez maiores economias do mundo, aparece apenas como o 25º maior exportador. Enquanto as exportações, média mundial, representam cerca de 42% do PIB de seus respectivos países, no Brasil elas representam apenas 13%. Ressalte-se também o altíssimo grau de concentração empresarial dessas exportações, na medida em que os 40 maiores exportadores brasileiros são responsáveis por quase 50% do total, enquanto que nos Estados Unidos é de apenas 10%.
Pesquisas realizadas pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em conjunto com a Escola de Administração de Empresas de São Paulo (Eaesp) da Fundação Getulio Vargas (FGV) (Desafios à competitividade das Exportações Brasileiras) confirmam o que muito já se sabe: as empresas brasileiras encontram um conjunto enorme de dificuldades para realizar suas exportações, desde os altos custos do transporte, passando pelas altas tarifas cobradas por órgãos anuentes, até o excesso de leis e documentos complexos e conflituosos existentes na enorme burocracia que envolve as atividades empresariais brasileiras, notadamente aquelas relativas ao comércio exterior.
Numa escala de 1 a 5, na qual a nota 1 indica pouco entrave e a nota 5 entrave crítico, a pesquisa Eaesp-FGV e CNI demonstrou que, dentre os 62 principais itens listados, o mais crítico é o custo do transporte, que obteve a nota 3,61. Elevadas tarifas cobradas nos portos e aeroportos ficaram em segundo, com a nota 3,44. Como ilustração e uma das explicações para essa péssima nota, a Confederação Nacional dos Transportes (CNT) calcula que a má qualidade das rodovias brasileiras, nas quais trafegam mais de 60% do total de cargas movimentadas no Brasil, adiciona na média dos custos operacionais, especificamente com combustível, pneus e manutenção, cerca de 25%! A CNI estima que apenas uma queda de 10% no custo do transporte poderia gerar mais de 30% de acréscimo nas exportações brasileiras!
Ainda segundo o estudo realizado pela Eaesp-FGV e a CNI, mas analisando-se apenas os chamados entraves logísticos, em que o custo do transporte alcançou a maior nota, pode-se constatar que há vários outros problemas para serem solucionados, tais como baixa disponibilidade e ineficiência dos portos (nota 2,53); situação das rodovias (nota 2,46); baixa oferta de operadores logísticos e transportadoras (nota 2,18); baixa oferta de terminais intermodais (nota 2,08); baixa disponibilidade e ineficiência dos portos secos (nota 2,03); baixa disponibilidade e ineficiência dos aeroportos (nota 1,99); baixa oferta de hidrovias e portos fluviais (nota 1,85); e situação das ferrovias (nota 1,75).
Outra conclusão apresentada pela pesquisa indica que enquanto as grandes empresas consideraram o custo de transporte ainda mais crítico, as micro e pequenas empresas, que representam 64% dos exportadores brasileiros, apontaram os aspectos relativos à legislação e à disponibilidade de capital seus grandes problemas.
Por outro lado, estudos elaborados pelo próprio Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) também apontam a burocracia brasileira como um dos maiores fatores de inibição de nossas exportações. Excesso de complexidade para elaboração dos documentos de exportação, inclusive com exigência de diversos documentos originais, em papel, com diversas aprovações e assinaturas reconhecidas, procedimentos complicados e confusos, demasiado tempo para fiscalização, despacho e liberação de mercadorias, falta de padronização de procedimentos e de sincronismo e coordenação entre os diversos órgãos anuentes e a aduana e extrema dificuldade no acesso de informações, são apenas alguns exemplos. Outro estudo inédito da CNI mostra que as exportações brasileiras são sujeitas a 46 procedimentos diferentes, administrados por 12 órgãos, enquanto que nas importações há 72 obrigações controladas por 16 órgãos do governo.
Dados do Banco Mundial, por sua vez, dão conta que em face da burocracia e do excesso de exigências aduaneiras, o prazo médio para a exportação de mercadorias nos portos brasileiros é de 13 dias e das importações 17 dias. A CNI, com base nesses dados e em estudo específico, mostra que esses atrasos representam custos adicionais médios entre 13% e 14%, para todas as exportações e importações brasileiras.
Sob outra ótica, caso se leve em consideração a distância e o tamanho dos mercados, estudos da CNI comprovam que as exportações brasileiras para a América do Sul, com exceção do Equador e da Bolívia, têm tido desempenho negativo se comparados com os seus verdadeiros potenciais, diante da limitada e deficiente infraestrutura brasileira de logística. Essa pesquisa foi realizada junto a 847 empresas exportadoras (cerca de 4,2% das 20.322 empresas brasileiras que exportaram em 2015) e que representam 25 dos principais segmentos econômicos. Como curiosidade: 56,5% dessas empresas utilizaram, nas operações de exportação, o modal marítimo; 22,5% o aéreo; 20,7% o rodoviário; 0,2% o fluvial; e somente 0,1% utilizou o modal ferroviário. Detalhes da pesquisa estão no site http://desafiosexport.org.br.
Não é à toa, portanto, que os Índices de Desempenho em Logística (LPI – Logistics Performance Index) brasileiros, regularmente publicados pelo Banco Mundial, colocam o Brasil entre as últimas posições quando comparados com os dez maiores países de renda média-alta. O LPI é montado com base na percepção de empresários e executivos entrevistados e os itens analisados, através de médias ponderadas, são a eficiência do processo de desembaraço (rapidez, simplicidade e previsibilidade do controle das fronteiras por parte das autoridades, incluindo as alfândegas), a qualidade do comércio e infraestrutura relacionada com o transporte (portos, ferrovias, estradas e tecnologia de informação), a facilidade para contratar o transporte com preços competitivos (disponibilidade de empresas transportadoras, concorrência, poder de barganha), a competência e qualidade dos serviços logísticos (operadores de transporte, agentes de carga, despachantes), a capacidade de rastreabilidade da carga, e a integridade de schedule (cumprimento dos prazos de entrega previstos).
Portanto, a quase totalidade das pesquisas e estudos realizados sobre a baixa produtividade e a falta de competitividade das empresas brasileiras, notadamente aquelas voltadas à exportação, chega ao mesmo diagnóstico: excessiva e complexa burocracia, não só nas atividades de comércio exterior como nas atividades logísticas, indefinição quanto a uma concreta e clara política nacional de transportes, com ausência de políticas de integração entre os diversos modais, ineficiente e insuficiente infraestrutura logística e de transporte, falta de marcos regulatórios, planejamento e investimentos voltados à logística e modelo de gestão ultrapassado, não profissionalizado e sem integração, posto que a maioria das agências reguladoras, por exemplo, trabalha de forma independente umas das outras.
Muitas esperanças foram depositadas no Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte (Conit), criado em 2001 com o objetivo de propor políticas nacionais de integração dos diferentes modos de transporte e pessoas e bens (órgão da administração direta, vinculado à Presidência da República) e na Empresa de Planejamento Logístico (EPL), criada em 2012 com o objetivo de planejar e promover o desenvolvimento do serviço de transporte ferroviário de alta velocidade de forma integrada com as demais modalidades, e prestar serviços na área de projetos, estudos e pesquisas destinados a subsidiar o planejamento da logística e dos transportes, em todas as suas modalidades.
Infelizmente o Conit reuniu-se apenas duas vezes desde a sua fundação, sendo a primeira vez somente em 24 de novembro de 2009, e a EPL também tem tido desempenho sofrível e muito distante do cumprimento de sua missão. Impossível, consequentemente, que o país consiga estabelecer corretamente as prioridades e integrar as atividades logísticas e de transportes, imprescindíveis para o desenvolvimento nacional. O que dirá cuidar dos investimentos necessários para atualizar a infraestrutura brasileira. A CNT, ao elaborar o documento O Transporte Move o Brasil – 2018, para ser encaminhado aos candidatos à Presidência da República, estimou em R$ 1,7 trilhão o total de investimentos necessários para que o Brasil adeque e expanda sua malha viária de acordo com as necessidades atuais. É possível imaginar como isso poderá ser feito sem planejamento e políticas claras e integradoras?
Mesmo num momento de crise como a atual, e às vésperas de um novo governo, é necessário que haja decisão política no sentido de se buscar soluções para os problemas ligados à logística. Se o início da solução para a crise econômica instalada está na busca do equilíbrio das contas públicas, a retomada de investimentos, com significativa e decisiva participação do setor privado, também se mostra necessária, em especial aqueles voltados à expansão e ao desenvolvimento da logística, posto que são fundamentais para manutenção da eficiência das atividades de comércio exterior, notadamente as exportações. Não se pode esquecer que foram os sucessivos superávits comerciais os principais responsáveis pela estabilidade da moeda, pela garantia de importações e pela geração de divisas, fatores que diminuíram a vulnerabilidade brasileira perante crises oriundas do exterior.
Uma logística eficaz é fator de fundamental importância para o aumento da produtividade e da competitividade das empresas brasileiras, algumas das imprescindíveis condições de retomada do crescimento econômico, da geração de empregos e de rendas.